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Conferência Nacional do Meio Ambiente reiterou desafios
Ministra Marina Silva no encerramento da V Conferência Nacional do Meio Ambiente (Foto Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Conferência Nacional do Meio Ambiente reiterou desafios 1v722q

Por José Pedro Soares Martins

Depois de 12 anos da última edição, ocorrida em 2013, foi realizada entre 6 e 9 de maio, em Brasília, a V Conferência Nacional do Meio Ambiente, com o tema “Emergência Climática e o Desafio da Transição Ecológica”. A etapa nacional foi precedida de 439 conferências municipais, 179 intermunicipais e 287 conferências livres, além das etapas estaduais, onde foram indicados os delegados ao encontro final.

         Muita gente, portanto, esteve envolvida no processo da V Conferência Nacional do Meio Ambiente, o que em si é salutar pelo seu aspecto pedagógico. As estimativas são de 65 mil pessoas  envolvidas nos diversos momentos. O tema central, que não poderia ser outro que o da emergência climática global, foi então discutido por muita gente e para muitos apresentado provavelmente pela primeira vez.

         O processo foi organizado em cinco eixos, sempre considerando o tema central:  Mitigação, Adaptação e Preparação para Desastres, Justiça Climática, Transformação Ecológica e Governança e Educação Ambiental. 

       Ao longo do processo, foram produzidas 2.635 propostas,  fruto das discussões realizadas em torno do tema principal e dos cinco eixos. Houve então importante preparação, até a etapa final na capital federal.

         Na V Conferência, foram aprovadas 104 propostas, reunidas em um documento encaminhado ao governo federal. A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, participou da plenária final e recebeu o documento.

          Tudo muito louvável e necessário, pois marcou a retomada, no âmbito do meio ambiente, da discussão democrática sobre muitos temas relevantes para o país, inclusive este, nos governos de Michel Temer e principalmente no de Jair Bolsonaro, quando foram extintos os Conselhos participativos que tinham sido legitimamente  eleitos anteriormente.

           Entre as propostas aprovadas, muitas avançadas, como a da garantia de destinação de no mínimo 5% do orçamento dos entes da Federação (União, Estados e Municípios), em face da emergência climática, para implementação da Política Nacional do Meio Ambiente, com ênfase nas ações de gestão, fiscalização, restauração florestal e educação ambiental e climática. 

     Uma meta muito ousada, considerando que os orçamentos dos governos nunca foram generosos com a questão socioambiental. Por exemplo, como citado recentemente nesta Hora da Sustentabilidade, um recente estudo do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) mostrou que somente 0,16% da renda do petróleo no Brasil, que foi de R$ 137,9 bilhões em 2024, foi direcionada à agenda ambiental e climática. 

      Outras propostas aprovadas incluíram a regularização fundiária, o incentivo à agricultura regenerativa, o fomento às cooperativas de reciclagem, o fortalecimento dos Comitês de Bacias Hidrográficas, a ampliação de áreas verdes no planejamento urbano com espécies nativas adequadas. Muitas propostas, portanto, reiterando demandas que já vêm sendo levantadas há anos por cientistas e ambientalistas.

        A sensação que fica é que, apesar da elogiável retomada do processo da Conferência Nacional do Meio Ambiente e do grande empenho e compromisso dos organizadores e participantes, a questão socioambiental, que inclui temas dramáticos e urgentes como a emergência climática, continua limitada no Brasil aos círculos diretamente envolvidos. 

    Sim, pesquisas indicam que os brasileiros em sua maioria estão cientes dos riscos dos eventos climáticos extremos e apoiam medidas efetivas para seu enfrentamento, como também já salientado neste espaço do Hora Campinas. Contudo, a temática socioambiental de modo geral ainda não parece ser uma prioridade absoluta para grande parte da sociedade civil e população em geral, com justiça preocupada com o seu ganha pão cada vez mais caro na padaria.

        Mas é fundamental que seja ampliada a consciência de que, sem o equacionamento dos graves desafios socioambientais em curso, as mudanças climáticas entre eles, o pão ficará cada vez mais caro. Os recursos naturais do planeta estão sendo esgotados em velocidade alarmante, a rápida extinção da biodiversidade ameaça as teias de vida construídas na Terra ao longo de bilhões de anos.

        Nesse sentido, tornaram-se ainda mais relevantes as propostas aprovadas na V Conferência Nacional do Meio Ambiente relacionadas à educação socioambiental. Apenas com estratégias corajosas, intersetoriais e com os necessários recursos para promover uma ampla e abrangente educação socioambiental a nossa sociedade estará mais capacitada para enfrentar os complexos dilemas atuais e que tendem se agravar rapidamente.

         Na V Conferência, a respeito, foram aprovadas propostas como a instituição de um “sistema nacional de financiamento permanente para educação ambiental destinado às organizações da sociedade civil e órgãos públicos, para projetos comunitários e educacionais, priorizando as ações alinhadas aos objetivos de desenvolvimento sustentável e ações de adaptação climática, assegurando a participação social na gestão”.

      Outra proposta nessa linha foi a de implementação e fortalecimento da educação ambiental “de forma obrigatória em todos os níveis de ensino e espaços educativos formais e não formais, com transversalidade e abordagem prática, participação popular, recursos adequados, formação continuada de profissionais, valorização de saberes ancestrais e planos, programas e projetos de educação  ambiental nos municípios, alinhados com a Plano Nacional de Educação Ambiental e aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), criando mecanismos de controle”.

        Uma oportunidade importante para o fortalecimento da educação socioambiental no Brasil está no momento de debate e aprovação do novo Plano Nacional de Educação (PNE), que está em fase avançada de discussão no Congresso Nacional e conterá as diretrizes educacionais do país até 2034. É muito importante que a sociedade acompanhe a formulação do novo PNE, para que ele contemple com clareza e firmeza a urgência de uma ampla, transversal, democrática e plural educação socioambiental no Brasil. Apenas  com essa base é possível garantir o que se sonha hoje em termos de sustentabilidade, em todas as suas faces. (Artigo publicado originalmente no portal Hora Campinas dia 13 de maio de 2025)

 

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